Por dentro das artérias
Uma nova área da Medicina, a radiologia intervencionista, realiza operações pelo corpo inteiro usando os vasos como via de acesso. Muitas vezes alcança áreas inacessíveis ao bisturi comum
A foto que você vê à direita é de um aneurisma da aorta abdominal — essa artéria apresentava uma dilatação tão anormal que suas paredes se romperam. Oito em cada dez portadores do problema morrem quando isso acontece. O desafio dos médicos é reconstruir esse vaso, o maior e um dos mais importantes do nosso corpo, antes que seja fatal. Até bem pouco tempo atrás a única saída era rasgar o abdômen do paciente da altura do peito até um ponto abaixo do umbigo e consertar de perto a anormalidade.
Em seguida a recuperação em uma UTI podia levar dias, com grandes chances de o indivíduo não resistir. Hoje, porém, tudo pode se resolver com um furo do tamanho da ponta de uma caneta, depois de uma anestesia local. A recuperação? Dura apenas algumas horas. O que permite a proeza é a radiologia intervencionista. Para leigos ela poderia ser traduzida como uma cirurgia feita por imagens. A área recém-nascida da Medicina — para você ter idéia, só chegou no Brasil em 2002, o que para a ciência é anteontem — começa a se popularizar.
“Ela permite desde abrir caminho em vasos entupidos até tratar alguns tipos de tumor”, explica o professor Francisco César Carnevale, da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, que, para se tornar um dos maiores conhecedores desse novo campo, estudou mais de dez anos em vários países do mundo, aprendendo as diversas aplicações da radiologia intervencionista. Afinal, só o tempo lapida a perícia necessária para viajar pelas artérias com ferramentas miniaturizadas e com tecnologia de ponta.
Nas operações da radiologia intervencionista quase não há sangue ou risco de complicações e infecções. Não à toa, são conhecidas nos meios médicos como cirurgias sem bisturi e sem traumas. Tudo começa com um fio-guia que é inserido na artéria do paciente por um furo que varia de reles 1 milímetro a 5 milímetros, no máximo. Ele merece o nome que tem: define a trajetória de todo o procedimento. Logo depois, pelo mesmo buraco, passa um cateter. Para enxergar o que acontece dentro desse caminho — onde está e por onde pode seguir — o cirurgião libera na corrente sangüínea pequenas doses de um contraste, substância que vai tornar os vasos visíveis para o aparelho de angiografia — algo como um super-raio X que fornece cerca de 30 imagens digitais por minuto.
“Temos um conhecimento detalhado da anatomia e sabemos exatamente quais os caminhos que devemos seguir para alcançar até mesmo o mais fino e profundo dos vasos”, explica o professor Carnevale. A propósito, artérias muito finas nem de longe são um problema. “Há até cateteres com o diâmetro de um fio de cabelo”, conta.
Fonte: Revista Saúde – Abril